...e se o papa for evolucionista!


Dizem que os franciscanos são uma ordem que cultiva a ciência e a tecnologia. Imagine se o novo papa for de uma linha neo-evolucionista e quiser moldar a Igreja de uma hora pra outra, ao figurino de Charles Darwin? Numa dessas manhãs, brumosa e fria, em que fiéis e peregrinos lotam a Praça de São Pedro à espera de palavras de conforto, e Sua Santidade,  contrariando a todas as expectativas, se sai com essa:

“Hermanos, por um mistério que ainda desconhecemos, mas que a ciência há de desvendar o mais breve possível, o universo palpável surgiu de uma explosão fenomenal, há cerca de 14,5 bilhões de anos.  Os estilhaços fumegantes do artefato pré-universal, numa pirotecnia medonha, foram lançados em todas as direções, num movimento feroz de distanciamento do núcleo. Com o açoite desses corpos, surgiram simultaneamente o tempo e o espaço. A reação permanente dos elementos, que compunham cada pedaço lançado em direção ao infinito, gerou grandes nuvens gasosas, poeirentas e que, ao longo do tempo,  foram dando origem a sistemas integrados de  estrelas, planetas, satélites, cometas, meteoros e tal. 

A nossa Terra, por exemplo, o quinhão do universo que habitamos, teria surgido 10 bilhões de anos depois daquela explosão primordial. Ou seja, 4,5 bilhões de anos atrás, a Terra surgiu dos detritos e escórias de outros corpos celestes. E a vida, quando teria dado as caras por aqui? Depois de um bilhão de anos de resfriamento da Terra, numa conjunção singular de condições químicas e climáticas, surgiram as primeiras formas de vida. Uma vida muito singela, de uma célula só. No entanto aquela célula ancestral continha já, em seu núcleo, uma cadeia de DNA, nos moldes da vida hoje, como a conhecemos. Aqueles seres simplórios, mas tinhosos, foram se integrando em várias formas de associação. As parcerias mais bem sucedidas deram origem a seres mais complexos e várias espécies surgiram a partir dessas cooperações instintivas e altamente proveitosas para os indivíduos que nelas se envolviam.

“E nós humanos, quando demos o ar da graça? Nós, como espécie, acabamos de chegar. Pesquisas recentes dão conta de que os primeiros hominídeos surgiram há cerca de 160 mil anos.  Ainda estamos na fase de reconhecimento da área. Só para se ter uma ideia da fração de tempo que estamos aqui, os dinossauros dominaram a paisagem por cerca de 160 milhões de anos. Ou seja, toda a existência de nossa espécie equivale a 0,01% do tempo que durou o domínio dos dinossauros.

“E o surgimento de Deus, quando se deu? Deus é uma ideia surgida no processo evolutivo. Sendo o homem, o ser mais complexo da Terra, ele buscou a transcendência, a figura de Deus. Deus, a cereja do bolo evolutivo,  é com certeza, a figura mais recente de todos os seres. Deus talvez não tenha mais do que 10 mil anos. E nossa responsabilidade é grande para com Ele.  Se nossa espécie fracassar, Deus fracassará conosco. Pois não há nenhuma outra espécie com noção transcendente, que possa perpetuar a noção da existência de Deus sobre a Terra.”

E estilhaços de uma explosão sem precedentes começam a se lançar do núcleo em Roma em direção ao resto do mundo.

(Publicado no jornal O Popular - Goiânia - Goiás em março de 2013).

1 comentários:

  1. INCRÍVEL FANTASIA ENTRE ASPAS, UM MUNDO DE ILUSÕES POÉTICAS!
    uM MERGULHO COESO, COERENTE E INESPERADO NO CAOS REVISITADO, BEM COMO UM RETORNO "SEGURO" AO TÃO ENFADONHO TEMPO PRESENTE...
    UM COLOSSO ENTRE AS ASPAS.
    TEXTO DE "FINCAR AS ASPAS" = CAIR DE CABEÇA PARA BAIXO!
    EIS QUE EDIVAL MOSTRA, A VALER, O BOM USO DAS ASPAS.
    Parabéns!

    ResponderExcluir

Obrigado por comentar. Logo que eu puder, libero e respondo o seu comentário.