O gigante acorda e dá chiliques

O Hino Nacional Brasileiro se refere ao país como “um gigante pela própria natureza (...) deitado eternamente em berço esplêndido”. Essa história de gigante nos remete a alguma história infantil ou a certas anomalias proporcionadas por algum descontrole hormonal. Pela hiperatividade da glândula hipófise, talvez.

E como o hino ainda informa que o gigantismo é pela própria natureza, certamente é porque se trata de um mal congênito, de nascença. Que, pelo menos no senso comum, é uma coisa mais difícil de ser tratada.  Um gigante pela própria natureza seria assim um mondrongo que já nasceu com exacerbação hormonal e cresceu muito além da conta, de maneira disforme e monstruosa.

Esse dito mondrongo ainda tem outra agravante em suas características: vive deitado eternamente.  E uma informação suplementar nos dá conta de que seu berço é esplêndido. Imagino que se trata de um gigante dorminhoco, mas proprietário, por herança, de um grande patrimônio, que desperta a cobiça de muita gente. E existe um grupo de pessoas que administra seus bens, enquanto ele se entrega à sua atividade preferencial: dormir.

Mas, de repente, o gigante acorda.  Não entende direito o que se passa. No entanto, pelas conversas que ouviu em surdina enquanto transitava do somo para a vigília, sabe que algo de errado paira no ar e lhe aguça a desconfiança. Como o gigante passou a vida quase toda dormindo, não se preparou para o embate, para o combate e se arvora em disparates.

 Ao invés de pedir uma auditoria independente, uma contabilidade autônoma ou promover uma ação judicial de prestação de contas, o gigante acorda e surta, no maior chilicão.  Berra feito um louco, dá socos no ar, rasga a própria roupa, ameaça todo mundo, mete o pé no mobiliário, joga pratos no chão, bota fogo na lixeira e promove o maior quebra-quebra da história.

As pessoas encarregadas de gerir os bens do gigante estão atônitas, pois das outras vezes em que supostamente gigante acordou era de maneira mais dócil, a não ser por um ou outro acesso de raiva repentina, que logo passava. Agora, não. A fúria é mais feroz e crônica. Os gestores batem cabeças, andam em roda, sondam marqueteiros, cientistas sociais, economistas, advogados, pais-de-santo, gurus de mística variada na busca frenética por saber o que objetivamente, poderia estar desejando a fera. O que poderia aplacar a fúria do gigante.

Apesar da enxurrada de palpites, até agora ninguém tem certeza do que o gigante quer de fato e qual o volume de estragos ele poderia promover até que se acalme. As autoridades a cada momento oferecem uma coisa ao furioso. Olha este sorvete de passas ao rum (calmante no lugar do rum): gostoooso! E o gigante: argh! E mete o pé na taça ofertada. Toma esse melzinho na chupeta! E o gigante nem dá moral. Que tal um chazinho paregórico de sabugueiro ou artemija? E o gigante continua enfurecido.

Sem saber o que pode aplacar a fúria, o pessoal da segurança sugere um tiro de dardo anestésico, por via institucional. Os técnicos agora trabalham na identificação da dose certa. Pois se houver erro, pode potencializar a fúria.     

(Publicada no jornal O Popular - Goiânia - Goiás em julho de 2013).


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