As agruras de um marido suspeitoso

Ficou de cabelo em pé no dia em que soube que havia um funcionário novo na seção em que sua mulher trabalha. Para ser mais claro, não dormiu aquela noite. Ele viu que as colegas da mulher falavam do jovem trabalhador num regozijo singular, num assanhamento de galinha na granja. Depois de alguns goles a mais então, elas nem disfarçavam dos maridos para tecer loas ao novato. 

O moço tinha um histórico de modelo internacional. Teria desfilado nas passarelas mais chiques do mundo e namorado as estrelas mais cobiçadas da música pop, da moda, do cinema e por aí afora. Era o desejo de consumo de dez em cada dez mulheres. E como um moço com essa pauta de atributos poderia ter ido parar naquela seção de trabalho de mortal comum? Conta-se que o avô, não tendo outro sucessor à altura, teria o convencido a deixar a carreira de modelo e se preparar para assumir a direção do grupo, daí a alguns anos. Então, para conhecer as empresas de baixo a cima teria começado ali naquela seção. 

Quando o marido viu o moço, o que era apenas medo virou pânico. O cara era realmente belo além da conta e não haveria mulher no mundo que pudesse resistir a um galanteio seu. Na verdade, nem seria preciso galantear. Era só corresponder às cortes femininas e ter na cama as mulheres que quisesse, do jeito que quisesse. 

E o marido continuou com a pulga na virilha.  É que sua mulher é daquelas de tomar iniciativas, partir pra cima dos objetivos sem pestanejar. E recorda que, mesmo não tendo nem um triz do charme daquele rapaz, foi ela quem tomou a iniciativa do namoro, da primeira transa, do noivado, do casamento e outros tantos marcos do relacionamento entre dois. Se ela se interessar pelo novato e ele der mole, ninguém segura. E como uma mulher bonita e decidida como a sua não haveria de se interessar por um rapaz de beleza tão exuberante como aquele?

Mas, naquele dia e nos dias seguintes, o marido percebeu que ao contrário das outras, sua mulher se portava com muita discrição e até indiferença diante  do jovem de beleza doida que levava o mulherio a perder a compostura. Ficou na surdina para ver se ela, fora de sua vigilância ostensiva, faria algum comentário malicioso ou mesmo tomava alguma atitude de assanhamento. Mas, nada. Ela se portava contrita e fiel, qual Madre Tereza de Calcutá. Não se exultava nem se deprimia ante o belo moço. Finalmente conformou-se. Sua cisma era coisa de sua cabeça. Sua mulher realmente era digna de toda confiança desse e do outro mundo. Uma Santa. 

No entanto, as suspeitas voltaram com fúria redobrada, num zunir de moscas do chifre. Deu-lhe o estalo: E se ela fosse do tipo dissimulada que finge indiferença só pra não dar bandeira, mas nos amoitados da cidade grande ela já tenha é um caso com o moço?  Se ele também for fingido e tenha com ela um trato de juras secretas? Porque – ele pensou – não é possível a mulher nenhuma, que tenha saúde boa e convulsão pélvica, se porte com tanta indiferença ante uma beleza masculina tão rara.

 – Aí tem! Ah se tem! – Suas noites voltaram a ser um inferno de suspeitas sem fim!

(Publicado no jornal O Popular - Goiânia - Goiás em agosto de 2013).

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