Rei Arthur e o Batmóvel a pensamento

Meu netinho Arthur, de três anos e meio, veio passar o dia aqui em casa. Já chegou ligado na programação do dia, que ele mesmo traçou: Ir à loja de brinquedos, comprar o carro do Batman, o  Batmóvel, de controle remoto. Estava tão agitado que até se esqueceu dos rituais de aproximação e encontro. Não deu a corridinha costumeira para o abraço com beijos, nem perguntou se a vovó estava bem. Ainda à distância foi logo gritando que queria o vovô para comprar o Batmóvel.

Minha filha se foi pra correria dela. Tentamos ganhar tempo com o reivindicante. Oferecemos petinha, batata frita, jujuba e nada de fazê-lo abandonar a ideia fixa de adquirir o tal do Batmóvel. A vó falou que ia fazer omelete, pra ele tomar com suco de caixinha. Em vão.  Propôs ligar a televisão no canal de desenhos. E nada.

Já estava passando do pedido cordial para a exigência com irritação. Seus olhos já marejavam em sinais de pretensões contrariadas e brotavam em seu rosto as primeiras rugas da birra. Me lembrei que ele gosta muito de brincar com o aparelho de tomar pressão. Retirei-o da caixa e já vim com a pulseira aberta: o vovô vai tirar sua pressão. E ele, inabalável, disse, recolhendo os braços para trás: Não quero. Depois quem é que vai devolver minha pressão? E, sem dar tréguas, continuou na insistência, já começando uma sessão de dança birrenta.  

Se fosse pai, eu o teria contido, para efeitos pedagógicos. Mas como não é esse o papel do avô, falei pra minha mulher: Arruma que nós vamos comprar o Batmóvel para esse Rei Arthur. Eu já tinha visto o Batmóvel num supermercado mais barato do que na casa de brinquedos. E lá fomos nós, contaminados pelo entusiasmo infantil. O Arthurzinho achou o supermercado longe de casa. Achou que a fila demorou. Mas foi questão de meia hora já estávamos de volta, com o Batmóvel possante em sua caixa de papelão e transparências. 

Chegamos em caso e sentamos ao chão, eu, minha mulher e o netinho, como três crianças embevecidas, para desembrulhar o mágico veículo. Retiramos a sacola de plástico, o embrulho de presente, abrimos a caixa, removemos os amarrilhos e ligamos os interruptores pra ver o bólido do Batman correr pela sala. Mas, para decepção geral, o carro viera sem as baterias. 

Imediatamente eu e o Arthurzinho encaramos a chuva, sob uma sombrinha troncha, em busca das baterias. Fomos às lojas próximas. E nada. Voltamos pra casa. Peguei o carro e fomos a uma casa especializada. Comprei as pilhas 2 A para o carro e a bateria 9 volts para o controle. Voltamos correndo e finalmente montamos o veículo. Não demorou muito para que o pequeno percebesse que o carro às vezes se movia sozinho e começou a chamá-lo de carro-fantasma, simulando medo. Eu disse que era só interferência das ondas de rádio. Passamos o dia brincando numa alegria pueril. Ao fim do dia, quando minha filha veio buscá-lo, aproveitando os movimentos autônomos do carrinho, ele fechava os olhos e exibia demonstrações de como movê-lo só com a força do pensamento. E a gente ria alto, em completa felicidade e ternura avoenga.         

(Publicada no jornal O Popular - Goiânia - Goiás em dezembro de 2013).



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